Tuesday 23 January 2007

20 anos e muitas mochilas depois


Há vinte anos, um Interrail ainda era um Interrail.
Por vinte e picos contos, viajava-se pela Europa fora, sem zonas nem nada dessas merdas que eles depois inventaram.
Por vinte e picos contos, comprava-se um caderninho castanho, no qual se inscrevia as viagens à medida que se ia fazendo. Quem levava aquilo à séria, ia à procura do revisor para ele picar as viagens (às vezes eles não controlavam, e ficava-se com uma entrada que podia ser verdade, ou não) - claro que eu levava aquilo à séria. Se o mês de viagens fosse mesmo prolífero, e o caderninho acabasse, ia-se a uma estação de comboios e pedia-se um acrescento.
Para mim, um dos pontos altos era passar por Colónia, e ir à Saturn. A Saturn era, à data, a maior loja de discos do mundo. Era tão grande, que os escaparates não tinham discos, mas sim fichas. Tinha de se ver nas fichas a localização do disco, e depois ir buscá-lo a outra zona, recheada de prateleiras a perder de vista.
Uma das coisas que me ficou gravada, era uma caixa com promoções. Era a discografia completa dos Smiths a preço especial. Por cima dizia: "The Smiths - prensagem portuguesa - 5 marcos" - eram perto de 400 paus. Já se sabia que a qualidade não reinava por cá.
Seja como for, na Saturn perdia dois a três dias do Interrail. E, quando saia, tinha a prova factual de que vinil pesa que nem chumbo. A mochila, à saida de Lisboa ia sempre semi-vazia, para reservar espaço para os discos. Como ainda era daquelas que tinham uma estrutura de aluminio externa, cabia ali um mundo e, de modo a ficarem encostados às minhas costas, dava para lá pôr os preciosos discos. Numa das vezes, por curiosidade, pesei a mochila à chegada a Lisboa - 47 kilos... à saida, pesava 15.
Toda esta lenga-lenga, para introduzir o asterisco sonoro de hoje. Os dois, aliás. Numa das viagens, conheci uns tipos belgas que levavam um gravador de cassetes, no qual passava com insistência uma canção chamada "Suicide Commando". Nem na Saturn o encontrei - demorei vinte anos até arranjar uma cópia, primeiro porque não sabia de quem era (achava que era dos Front 242), e depois porque os No More não foram lá dos grupos mais conhecidos do mundo.
A única canção que teve algum sucesso (e, mesmo assim, limitado a algumas discotecas na Alemanha e redondezas), foi precisamente o "Suicide Commando", que aqui fica até amanhã, a acompanhar outra deles.
Eu, de cada vez que a oiço, ainda tenho a impressão distinta de ouvir o "tchaca-ta" do comboio.

6 Comments:

At 23/1/07 13:31, Blogger B-Good said...

E, infelizmente, com a nossa idade, "no more" interrails.

 
At 23/1/07 21:00, Blogger asterisco said...

B-Good:
Também já não é a mesma coisa. Dantes, estavas em França e dava-te na veneta ires à Grécia, e ias. Agora, tens de comprar aquilo por zonas e, pasme-se, tens de planear...
Foi-se a essência.

 
At 24/1/07 11:39, Blogger nana said...

também fiz o interrail há uns anos e guardo belas memórias e muitas pics dessas andanças!!"no meu tempo" já havia "zonas" e fiz menos pesquisa discográfica, confesso!
;)
vou ouvir a musiquinha!

 
At 24/1/07 11:56, Blogger asterisco said...

Nana:
As zonas apareceram pouco tempo depois du meu último Interrail, prái em '90, ou coisa que o valha. Aquilo ficou bestialmente caro, desde então. Se tivesse havido zonas antes, podes ter a certeza que não me sobrava pilim para os discos.

 
At 25/1/07 02:12, Blogger pinky said...

o que eu gosto mesmo é do relato destas aventuras! e mais ainda de constatar a tua volta! cooool! welcomme back! que a estadia seja longa e prolifera. ;)

 
At 25/1/07 10:46, Blogger asterisco said...

Pinky:
Juro que a intenção é sempre essa. Só que, às vezes, é lixado.
Seja como for, desde que haja feedback, vale sempre a pena.

 

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