Thursday 9 November 2006

Eficácia


greve (Fr. grève), s.f. suspensão voluntária, colectiva e temporária do trabalho por um conjunto de pessoas por motivos de ordem laboral; paragem voluntária, colectiva e temporária de uma actividade por reivindicações de vária ordem ou por protesto (greve estudantil ou parede, greve de fome).
Dicionário Universal da Língua Portuguesa, 2ª edição, 1997, Texto Editora
Os ingleses, com pilhas de experiência nestas coisas, não fosse lá que nasceu o trabalhador operário moderno, é que a sabem toda. Lá, uma greve não tem um nome assim meio abichanado (ainda por cima, vindo de onde vem...). Lá, é "strike". Zás, trás, catrapás. Traduzido, nada mais que "malhar". Que é como quem diz "malhar nos gajos lá de cima". A razão é muito simples: as greves, lá, funcionam. A malta lá faz uma greve (lembram-se? A greve dos mineiros que quase derrubou a Thatcher?) e cá é notícia - paralisações de duas semanas ou mais, se for necessário.
Cá, como é?
Dois diazitos (bem ligados ao fim-de-semana, claro está, mas isso já é outra história - mete falta de moral e ética). Depois, volta-se para o trabalho e, veja-se lá, está tudo na mesma. Nós não fazemos greves. Apanhamos uma amigdalite colectiva.
A greve, por estes lados, serve para uma coisa só: duas a três vezes por ano, convém parecer que os dirigentes sindicalistas fazem alguma coisa. Então, aparece aquele energúmeno na televisão a declarar que "As massas trabalhadoras, portant's, vam's fazer 'ma greve.". Depois, retira o rascunho com as anotações sempre válidas para aquela tomada de medida ("Caraças, bendito papelzito, que já me safou durante os últimos 4-5 anos"), e desbobina as razões do costume.
Eu nem sou contra a greve, bem pelo contrário. Mas estas greves à faz-de-conta... façam-me lá um favorzito e vão sentar-se num granda porco.
Os sindicatos, hoje em dia, recebem dinheiro dos filiados para quê? Para que ciclicamente lá seja mais um dirigente processado por apropriação indevida, pelos vistos.
Para isto ser eficaz, era só aplicar o que se faz noutras bandas: separação dos sindicatos e dos partidos políticos, e obrigatoriedade dos sindicatos pagarem os ordenados dos filiados durante uma greve.
Seriam menos greves, é verdade, mas de certeza que mais prolongadas e eficazes. É que a greve, meuzzzz amigozzzz, e isto é um segredo muito bem guardado que aqui divulgo, é um último recurso.
Por isso é que cá temos greves e não "strikes": o governo estás-se perfeitamente marimbando para cumprir as exigências dos sindicatos, porque sabe que, dois dias depois, fica tudo na mesma. E os sindicatos salvam a face, convocam a greve e assim até parece que fizeram algo. E o trabalhador, dois dias depois, volta para o mesmo lugar, as mesmas ferramentas e as mesmas condições. Enfim, deram-lhe um fim-de-semana prolongado.
Doutro modo, os sindicatos só faziam greve depois de tudo muito bem ponderado, o governo até tremia só de pensar na possibilidade e os trabalhadores, vejam lá, até poderiam retirar algum benefício daquilo. Pelo menos, não seriam prejudicados. E a filiação num sindicato até passava a fazer sentido. O que, por sua vez, fortalecia o sindicato. E talvez, então, podiamos deixar de chamar-lhe greve, e chamar-lhe "pazada" ou algo igualmente catrapás-impactante.
Agora isto? Cada vez que há uma reunião entre governo e sindicalistas, já sei que vai haver algures uma sala cheia de engravatados a brincarem com a sua própria pilinha, porque ninguém, nem eles, acreditam que dialogar vá fazer grande diferença.
Parafraseando Woody Allen, mais vale entreterem-se com um grande amigo.

7 Comments:

At 9/11/06 19:52, Blogger 1entre1000's said...

e na cabeçinha dos grevistas: ai este Verão de s.Martinho mesmo a calhar!!! Magusto em grande, com descanso prolongado...
São as cabeçinhas que temos no paizinho que temos, com o governinho que temos...

 
At 9/11/06 20:15, Blogger asterisco said...

1entre1000's:
Quando é tudo pequenino (como as greves também o são), o resultado também só pode ser pequenino.

 
At 9/11/06 21:16, Blogger Pseudo said...

É que tens mesmo razão! Eu já o disse: greves de 1, 2 dias poucos efeitos têm na minha vida profissional; agora uma paragem de 2, 3 semanas...um mês que fosse: isso sim! Provavelmente iria ficar economicamente enrascada, e com as orelhas bastante vermelhas, mas o país inteiro iria sentir uma greve destas!

 
At 9/11/06 21:26, Anonymous Anonymous said...

aplaudo de pé este texto, do princípio ao fim.
o conceito de greve, a actuação dos sindicatos, e o discurso anacrónico dos mesmos deveriam ser sujeitos a referendo.
boa malha, * ! até já merecias estar no frágil a posar para o Ben! (hihihiihihi)
:-)

 
At 9/11/06 21:32, Blogger asterisco said...

Pseudo:
Por isso é que digo: os sindicatos deviam ser obrigados a pagar o ordenado de quem, a "mando" deles, faz greve. Ao menos ficava-se a saber, que o dinheiro que se lhes dá seria verdadeiramente em nosso proveito.

Pudin:
Hehehe. Eu fui mais esperto: enquanto ele fazia click, eu estive ao lado dele.

 
At 10/11/06 10:23, Blogger B-Good said...

Vou-te contar 1 história: havia alguém, funcionária pública no verdadeiro sentido do termo, ou seja, a praticar serviços vets a preços reduzidos para munícipes de baixos recursos, que, de amor à camisola, sempre se recusou a fazer greve. A única vez que o fez, foi de zelo, ou seja, estava lá, mas não trabalhava. E nunca, mas nunca alinhava em fins de semana compridos.
No ninho de víboras das autarquias locais, foi engolida por várias...resultado: deixou de dar a camisola (pq só me vê as mamas quem eu quero), desmotivou-se a pontos de contar os minutos para a hora de saída, e amaldiçoou a funcionalismo público por não reconhecer quem é competente, mas quem tem cartão de militante.

Sim, tou de greve. 2 dias fora dali.

 
At 10/11/06 10:46, Blogger asterisco said...

B-Good:
O que tu contas, ainda é outro problema - por sinal, pior ainda, devido à perversidade das trincas políticas e oportunistas. Seja como for: já imaginaste a fezada que seria uma greve de duas semanas com ordenado pago (mesmo que só, por exemplo a 80%) nessas condições?!
Seja como for, percebo-te bem: o pior que me podem fazer, é estragar-me o prazer de fazer algo de que gosto.

 

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