Wednesday, 31 May 2006

Cópia vs. original


Ou seja: pode um cópia ser tão boa como o original? Boa, no sentido qualitativo da palavra, não como "gira" ou "engraçada".
Deve uma versão duma canção ser uma interpretação fiel, tal como o artista original a queria, ou pode / deve ser uma reinterpretação, segundo a percepção de quem a "copia"?
Será que a versão do "Ziggy Stardust" dos Bauhaus, na qual até a voz é igual à do David Bowie tem mais mérito do que a reinterpretação do "Smells like Teen Spirit", dos Nirvana, pela Tori Amos?
Eu cá, gosto de ambas, portanto aqui ficam, uma para re-ouvir durante mais um dia, e outra para, finalmente, depois de ouvirem a da Tori Amos, conseguirem trautear as letras.

Countdown


Faltam dois dias!

Tuesday, 30 May 2006

"PUF" de novo...


Lá voltar, voltou. Agora, que também se dissolveu (de novo) na atmosfera, lá isso também não restam dúvidas.
"THEY HEAR HIM!
THEY FEEL HIM!
But they can't stop him!"

Countdown


Faltam 3 dias!

Monday, 29 May 2006

Countdown


Faltam 4 dias!

20 segundos

Nada de fazer batota! Têm vinte segundos para descobrirem o nome e o autor original do asterisco sonoro de hoje. Quem já conhecer, aguente-se. A ver, a ver.
A primeira vez que ouvi esta da Tori Amos, fiquei naquela posição irritante do "Eu conheço isto, eu conheço isto..., Mazé o quê, caraças?!"

Friday, 26 May 2006

Bonecada


A todos, um fim-de-semana cheio de animação. Da boa, claro.

Thursday, 25 May 2006

Ferramentas


Sempre que surge a discussão sobre o que faz a diferença entre o ser humano e os restantes animais, aparece a expressão alada do "animal racional": que o ser humano é capaz de formar raciocínios complexos que outros animais não são. Isto, acoplado ao facto de os podermos veicular através de uma capacidade ímpar de comunicar, torna-nos diferentes de todo o resto do reino animal. É evidente que, ao longo dos tempos, quando foi verdadeiramente importante comunicar e raciocinar, acabamos em guerra com outros países, mas enfim. É o que nos separa do resto dos animais, pelos vistos.
Uma outra corrente de pensamento, adiciona mais um factor diferenciador: a capacidade de fazer e utilizar ferramentas. Quem é que não se lembra do início do "2001 - Odisseia no Espaço", no qual um ser humanóide pega, pela primeira vez, numa ferramenta? Claro que foi prontamente utilizada para destruir algo, mas lá está: nós somos o máximo em falar com paus e calhaus (era um osso, eu sei).
Claro que há outros animais que utilizam ferramentas, a começar pelos chimpanzés, que usam paus, e a acabar com gaivotas, que usam as pedras no chão para deixarem cair moluscos do ar e assim parti-los, passando pelas lontras marinhas, naquela imagem gira delas deitadas de costas no mar, com uma concha e uma pedra em cima da barriga, e com outra pedra nas patas, que utilizam como martelo, assim rachando a concha entre as duas pedras.
Mas o fabrico de ferramentas (que não só a procura de algo adequado a fazer a vez delas) é, pelo menos que se saiba, um exclusivo humano.
Para tudo se criam ferramentas. E por essa palavra, entendo não só as chaves de parafusos e associados, mas muito mais. Conheci uma vez um designer, que defendia que não havia brinquedos para crianças, mas sim o que ele chamava de 'tool toys' - ele dizia que qualquer objecto intermediário entre o ser humano e um resultado é uma ferramenta. Pode ser um 'tool toy', como pode ser um 'music toy'.
Por exemplo: é através de uma série de "music toys", que quatro tipos obtém como resultado o que hoje está a bombar nos asteriscos sonoros. Precisamente... Tool.
E dizem vocês: "Caramba, tanta merda para dizer que são os Tool a bombar!".
E digo eu: "Queixem-se ao gajo que me pôs um 'keyboard tool' nas mãos."

Pesquisa

Em publicidade, como em muitas áreas, uma das coisas mais importantes é uma pesquisa correcta sobre o que se quer comunicar. Não só por causa do perigo de se ser processado por publicidade enganosa, mas também porque não se quer passar o ridículo de fazer um erro crasso.
Estava na rua uma campanha que anunciava a chegada do KGB a Portugal, por exemplo. Agora, já se sabe do que se trata: são uns comprimidos que, se tomados correctamente, evitam a ressaca da bebedeira no dia seguinte (moralmente, não me parece uma coisa lá muito decente de se publicitar, mas isso já é matéria para outro post).
Eu só soube do que se tratava, porque a Cláudia me mandou um e-mail com o link. Apareceu isto:

Ora, bem. Sim senhor. Fica giro: "KGB - Ressaca kaput". Só tem um, vá lá, dois pequenos problemas:
  1. "Kaputt" escreve-se com dois "t";
  2. é uma palavra alemã, não existe em russo.
Pelo sim, pelo não, e porque até poderia ser que o alemão o tivesse "importado" do russo, fui ter a certeza do que estou aqui a escrever (lembram-se? Pesquisa!): bate certo.
Mandei-lhes um e-mail a chamar a atenção para isso, e vejam lá: lançaram um produto, mas o e-mail deles não funciona... Já não é falta de pesquisa, é bandalheira.

Wednesday, 24 May 2006

São primos, sem serem família


De vezes em quando, lá têm de gramar com um post sobre números.
Outro dia, por mera coincidência, reparei numa coisa, que nem sei se é só coincidência, mas fica aqui para a discussão:
Já repararam, que imensos números "míticos" são números primos (i.e. números inteiros maiores do que 1, somente divisíveis por 1 ou si próprios)?
No 2, passamos a vida a tropeçar e, por alguma razão estranha, achamos que os números pares (divisíveis por 2, portanto) são mais "perfeitos / bonitos" do que os ímpares.
Sobre o 3, já falei há uns tempos: na mitologia clássica é frequente a multiplicação de cabeças, braços, etc. por três (as três cabeças do Cerbéro, as seis da Cíla, etc.), mais tarde, Cristo caiu três vezes no caminho da crucificação, na qual estavam presentes três cruzes e, antes de morrer, Pedro renegou-o três vezes, tantas quanto cantou o galo. Uma promessa bem feita, deve ser repetida três vezes, em muitos países ocidentais.
O 7, é apresentado como o número da perfeição, na Bíblia (no Novo Testamento, particularmente) e sobretudo o 777 - três vezes sete, c'um caneco! E é um dos números que mais frequentemente é considerado "sortudo".
Do 13, já nem falo, é evidente que se trata de um número "mítico".
O que é particularmente curioso, é que a descoberta dos números primos se deveu aos gregos da antiguidade, e, nas civilizações que não foram demasiadamente influenciadas pelo ocidente, os números "míticos" foram escolhidos mais ao calhas, não tão ligados ao facto de serem primos (o 4, numa boa parte dos países asiáticos, é um número a evita como o diabo foge da cruz). Por cá, é-nos indiferente.

Trocou-lhes as voltas


O asterisco sonoro de hoje, é tirado de um CD do Neil Young. Anos a fio, andaram os Pearl Jam a dizer que ele era a sua grande inspiração, e que um dia ainda o haveriam de convidar para um dos discos deles, o que nunca aconteceu - o máximo que aconteceu, foi tocarem algumas canções dele, ao vivo (o "Keep on rocking in the free World" salta-me à memória).
O que deve ter acontecido, às tantas, foi o Neil Young fartar-se do discurso: se a montanha não vem a Maomé, Maomé vai à montanha, portanto convidou-os ele para serem o grupo de suporte dele num disco dele. E assim, gravou-se o "Mirrorball", com ps Pearl Jam "reduzidos" a acompanhar o mestre (somente uma das canções tem letras do Eddie Veder, o resto é todo do Neil Young).
Como curiosidade, diga-se que eles só aparecem mencionados nas notas dos créditos do livrinho; por razões legais, não podiam aparecem nem fotografias deles, nem sequer o nome "Pearl Jam" em lado algum. Mesmo assim, foi o álbum do Neil Young que mais alto subiu nas tabelas de vendas dos Estados Unidos, desde o Harvest (quase 25 anos antes). Se bem que não chegou ao topo, nem permaneceu nas tabelas por muito tempo.
Este disco é curioso, porque o início das canções apanha quase sempre um fragmento de diálogo entre os Pearl Jam e o Neil Young, e percebe-se, por aí, a metodologia dele: nada de perder tempo, a espontaneidade é tudo. Se o instrumento não estiver perfeitamente afinado, não há-de daí vir mal maior (foi assim, que chegou a ensaiar e gravar discos em duas semanas). Se ouvirem com atenção, no início da canção, ouve-se ele a dizer: "No tuning, nothing".
E assim, para hoje, Neil Young com os Pearl Jam (escondidos).

Tuesday, 23 May 2006

Crime, não é, mas...


Até onde vai a liberdade de uma pessoa se "inspirar" num texto doutro blog?
Ontem, por exemplo, recebi um mail, que achei melhor do que qualquer coisa que eu seria capaz de escrever sobre o assunto. E assim, postei-o aqui, com a indicação que era de um e-mail. E era, mas não directamente - era do desBlogueador de conversa, como depois descobri. Até aqui, tudo bem, até porque alterei o post de modo a reflectir a autoria.
Claro que, quando uma pessoa escreve algo num blog, está a partilhar livremente algo; não espera receber algo em troca, quando muito comentários (como se isso fosse pouco!). Aliás, já em tempos escrevi a minha opinião sobre blogues que servem para vender algo - se é uma ferramenta gratuita, não deve ser abusada.
Evidentemente, o "copy / paste" é permitido. Até é benéfico: uma pessoas não tem um blog somente para se agradar a si própria, mas também porque acha que tem algo que poderá entreter os outros. Mesmo que isso seja um exagero violentíssimo da capacidade de auto-avaliação de si próprio. A única regra da decência, é que se coloque a frase da praxe: "Este texto miserável foi regurgitado pelo asterisco", por exemplo. E eventualmente um link; também é uma coisa bonita, e nem dá muito trabalho.
Feio, mesmo feio, é por exemplo isto - descubram a diferença para o original. O senhor Viveiros pegou num texto, espetou-lhe com uma introduçãozita (sei lá se não gamada doutro lado) e ala de fazer dele o que não é.
Há, aqui, pelo menos três erros da parte do sr. Viveiros:
  • ele diz no cabeçalho que o blog dele é "Um blog... meu...". Como diz o Nelson Santos (o autor original do texto em questão), o blog poderá ser, mas as palavras, manifestamente, não o são;
  • se recebeu o texto por e-mail, deveria, pelo menos, ter assumido essa recepção;
  • copiar sem referir a fonte, é mau. Copiar de um blog com 400.000 hits sem referir a fonte, é burro. Se gamasse daqui, o cálculo de probabilidades ainda daria um resultado favorável ao sr. Viveiros - sendo que também diria mundos sobre a sua (in)capacidade de avaliação qualitativa.
Após a Just me me ter avisado que o texto era de um blog, lembrei-me de fazer uma coisa, que funcionou, portanto fica aqui a dica: Quando receberem um texto por e-mail que achem suficientemente bom para fazer o "copy /paste", seleccionem um excerto característico
dele e façam uma pesquisa no Google, com esse excerto colocado entre aspas. No meu caso, procurei por "não disseste mais cedo, Socas?" - apareceu o original e um post feito a partir dum e-mail, com a devida referência.
Como diz o cabeçalho: não é um crime. Muito menos, é o crime do século.
"E porque diabo é que esta abécula agora me vem com este paleio do crime do século?" - pensam vocês?
Porque não arranjei outro modo de fazer uma ligação aos Supertramp, que hoje ficam a bombar nos asteriscos sonoros, digo eu.
"És pouco rebuscado, és, ó minha grande abécula!" - Pois sou. mas o que é que querem? Apesar de tudo, isto é "Um blog... meu..." (sem referência de proveniência, hahahaha!!!).

P.S.: Num desenvolvimento muito recente, o senhor Viveiros desactivou o blog. Ou melhor, deve ter deslocado a sala de copista para outra freguesia. Sim, porque a blogosfera é uma mina de "copy / paste".

Monday, 22 May 2006

Não é, mas não faz mal


Bem pelo contrário. A história do médico que dá Aspirinas a um hipocondríaco, fazendo com que este se sinta imediatamente curado, já é velha. A mim, o que me tem feito um bem bestial, ultimamente, é ouvir o último dos Placebo. Para ver se também vos faz tão bem como a mim, aqui ficam duas, mesmo sem ser fim-de-semana.

Amiguinho

Este, foi-me enviado por e-mail, e eu não resisti.

Senhor primeiro-ministro, amigo Zé. Pá.

Já deu para ver que, no estado em que as coisas estão, há que sacar dinheiro ao pessoal de qualquer maneira. E como aumentar mais uma vez os impostos dava muito nas vistas, agora até na praia, o chamado mergulho de chapão com bandeira amarela ou mesmo uma simples entrada em água com bandeira vermelha, dá para colocar uma quantia valente (de 55 a mil euros) nos depauperados cofres do estado.
Caramba, porque é que não disseste mais cedo, Socas? Ora aqui o teu muito patriota amigo não quer que te canses a pensar em mais estratagemas deste tipo e envia-te uma lista de coisas que ainda não pagam multa, mas que, com a tua ajuda e com alguém que te prepare a legislação, é só meter no Diário da República e vais ver que o défice das contas estatais se esfuma num instante. E ainda se ajuda a tornar o nosso Portugal num país mais bonito, como bónus!
Ora cá vai disto:
LISTA DE COISAS A TAXAR (em breve)
  • uso de meia branca com sapatinho escuro (€100 a €1000);
  • bigode à futebolista dos anos oitenta (€200 a €2000);
  • coçar os genitais em público (€150 a €1500);
  • utilização do colete reflector nas costas do banco do condutor (€120 a €1200);
  • passear de fato de treino por centros comerciais ao fim-de-semana (€400 a €4000);
  • uso de óculos de sol em discotecas e restaurantes (€500 a €5000);
  • utilização das expressões "prontos", "portantos", "stander de automóves", etc. (€140 a €1400);
  • uso de sandália com peúga (€300 a €3000) - este, para ser uma mina, podes aplicar também aos estrangeiros;
  • uso de boné com pala (€50 a €500);
  • uso de boné com pala virada para trás (€500 a €5000).
Pronto, cá está, Socas, usa e abusa. Quem é amigo, quem é?

Entretanto, a Just me alertou-me para o facto de isto ter origem num blog. Pelo que consegui descobrir, é do DesBlogueador de Conversa. O seu a seu dono.

Friday, 19 May 2006

É para cumprir, do I ao X

Não sou Moisés (40 anos a atravessar um deserto com um bando de ingratos, permanentemente a protestarem, não faz o meu género), mas se os dez mandamentos sobreviveram durante 3500 anos, e ainda são seguidos, talvez isto se safe durante uns dois dias, mesmo que seja só eu a mandar:

Um bom, um imbatível

Aqueles três CDs dos quais eu falava há uns dias, já cá cantam - literalmente. E, como não sou de guardar estas coisas para mim, ficam aqui duas amostras para o fim-de-semana. Em primeiro lugar, os Amplifier. Esta, é tirada do primeiro CD deles - muito bom.
Em segundo lugar, e porque as coisas boas ficam sempre para o fim, os Tool. Ora bem... faltam uns seis meses e meio para o fim do ano, e eu arrisco-me a dizer, que dificilmente irá sair um disco melhor do que este até lá, neste registo. Com cada disco que passa, os Tool estão melhores. E, tendo em conta que o disco de estreia deles era um 9 numa escala até 10, isso quer dizer algo. A que fica aqui a bombar, nem é a melhor do disco; só que essa, tem 18 minutos...
Outra coisa que posso dizer, sem hesitar, e com a certeza absoluta de ter razão, é que não irá sair até Janeiro do próximo ano (no mínimo) um CD com uma capa tão espectacular. É comprar, mesmo que não se goste da música! A embalagem tem duas lentes incorporada que, quando se utiliza para olhar para o caderno no interior, faz aparecer tudo em 3D:

Ao olhar através das lentes para as duas imagens do livrete, ao fim de um pouco de tempo, elas fundem-se numa só, perfeitamente tridimensional.

Thursday, 18 May 2006

No more Bullshit

Tendo em conta o post anterior sobre a argumentação de merda, o asterisco sonoro de hoje era para ser só um, mas passou a dois. Como estava indeciso entre dois, e esta indecisão ameaçava prolongar-se para além do que seria admissível, optei pelos dois. O primeiro, para continuar com a violência do fim do post anterior, é dos Extreme Noise Terror, enquanto que o segundo é um hip-hop do Alkala.

Eh, toure lindeeee!!!!


Pablo Picasso (1881 - 1973)
"Tourada III - Picador"
manipulado digitalmente; para ver o original, clickar na imagem

toquei no assunto de raspão, mas como hoje é que é o dia da primeira tourada, desde há 7 anos, no Campo Pequeno, vou-me alongar um pouco mais.
Antes de mais nada, sei perfeitamente que isto é um exercício fútil; não vai alterar em nada a opinião das pessoas. Só o faço, porque acho que, em média, somos todos minimamente inteligente (sendo que daria pano para mangas o que cada um faz com essa inteligência), e que, em honestidade connosco próprios, às vezes temos de admitir que suportamos uma opinião com argumentos coxos. Não que isso nos faça mudar de opinião na maioria das vezes - infelizmente - e falo também por mim. Ou seja: gostem lá de tourada, mas parem com o nomear de argumentor parvos, por favor.
É evidente que se deve respeitar o costumes e tradições de um povo - em boa parte, são o que o distinguem dos outros. Mas acho que também se deve ter noção de que as tradições e os costumes podem caducar. Perde-se algo que é parte integrante de uma cultura? Talvez. Mas desde quando é que isso é necessariamente mau?
O argumento de que a tourada é um costume já antigo em Portugal, é, evidentemente, válido. Ninguém o disputa - existe desde o séc. XV, qualifica-se como antigo, evidentemente. Mas também era um costume antigo enterrar um galo na terra, deixando só a cabeça de fora, e depois ir a correr en direcção a ele e tentar decapitá-lo de um só golpe com um pau. Claro que a malta, como também manda a tradição, já vai bem etilizada para esta luta (feroz!) entre o homem e a besta, o que traz como consequência que a coisa só lá vá com várias tentativas.
Há muitas tradições a desaparecerem, e não vejo os senhores Ribeiros-Telles, Salvadores, etc. esforçarem-se minimamente para as defender. A Silvia (sem acento!), num comentário anterior, levantou mais um pouco a pedra sobre o assunto: enquanto houver pessoas dispostas a dar dinheiro, haverá sempre quem defenda uma tradição. As tradições morrem, pelos vistos, não por se tornarem obsoletas devido a uma mera questão de evolução social, mas por falta de dinheiro. Duas horas de picadaria em toiros, são €75 bem empregues. €300 por um tapete fiado à mão, que durará uma vida, bem tratado, são uma exorbitância, pelos vistos.
Alage Mamadu Dumbiá, da Associação de Muçulmanos Guineenses, disse uma vez o seguinte: "Não é crime. Não pode ser crime, porque é a nossa tradição!". Falava da mutilação genital feminina. E não vale vir com o contra-argumento de que aqui, estamos a falar de pessoas. Porque a equiparação da tradição de massacrar toiros com a de fazer tapetes de Arraiolos não é minha. Basicamente, o que é frequentemente dito pelos defensores das touradas, é que o facto de ser tradição é argumento suficiente. Pois então, assumam esse argumento em toda a sua plenitude. Doutro modo, não estão a ser consequentes. Lá vou eu voltar à adaptação da citação do George Orwell, no "Triunfo dos Porcos": Todas as tradições são iguais, mas algumas são mais iguais do que as outras?
É evidente, que a tourada move milhões, e que há muita gente a viver dela. Os ganadeiros, que criam os touros, p.ex. Se não criarem touros bravos, vão à falência. A isto chama-se "monocultura", e é sabido que é um dos maiores erros que se pode fazer. Fica-se dependente de um único produto. Quando, nos anos 30, o preço do café começou a descer brutalmente, devido a maior oferta do que procura, o Brasil, que era quase monopolista na produção dele (para além de praticamente viver às custas do café), começou a queimar café nas caldeiras dos comboios, para tentar subir o preço. Por acaso, devia ser bem agradável vê-los (cheirá-los) a passar!
A monocultura não só é má para o dono, como, evidentemente, para quem dele depende para trabalho. A solução para este problema, é diversificar, enquanto uma ainda dá dinheiro. Mas antecipação, por estes lados, só se conhece nos relatos da bola.
Em relação aos cavaleiros, nem falo - não dependem da lide em nada. São, na sua grande maioria, nascidos em berço de ouro, sendo que a discriminação em relação aos forcados e demais intervenientes na tourada é notória, até nos rituais durante todo o espectáculo.
É evidente que se deve respeitar os gostos das outras pessoas (tal como as tradições, já disse). Um dos argumentos é que as tourados são feitas em recintos fechados. Quem não gosta, não vai. Claro que a nossa sociedade se baseia na tolerância; mas a essa tolerância são impostos limites. Que, por vezes, até são um pouco estranhos: eu posso enfiar-me no Campo Pequeno e massacrar um touro, porque é tradição espetá-lo (e a lei o permite). Mas tentem lá enfiar-se no Campo Pequeno e organizar uma orgia desenfreada... No entanto, facilmente se poderá argumentar que também este acto de "o espetar" tem as suas tradições, porventura até anteriores ao séc. XV. E, no entato, não estão a incomodar ninugém que não queira lá ir. E, de certeza, que não incomodam nenhum bicho. Desde que estabeleçam bem as regras! Cuidadinho aí!!
Depois, há sempre aquele argumento de que o touro não sente nada, que só dói quando as bandarilhas são espetada nas costelas. A sério, nem me vou alongar sobre isto...
Outro argumento patético, é o da preservação da espécie do touro bravo. Vamos lá a ver os Grupo de Forcados Amadores de Vila Franca de Xira fazer uma pega de caras a um lince ibérico. Ou os chineses a bandarilhar um panda. Ou há moralidade, ou comem todos. Além de que, não estamos propriamente a falar dum animal "natural": o "touro bravo" foi praticamente criado para as touradas - um pouco como os cães de combate (outro dos bons costumes...). Houve, ao longo dos tempos, uma selecção genética da parte dos criadores, para criar animais mais "aptos" para a finalidade em questão. É, se assim quisermos dizer, uma perversão da natureza. Contra ela, até. Há uns tempos falei do significado de ironia; aqui fica um exemplo: vamos lá massacrar um animal, para o salvar da extinção.
Há, ainda, aqueles que argumentam que a tourada à portuguesa até é boa para o animal, que o touro de morte até é proibido, por cá - a não ser que a cobardia política decida criar excepções. Francamente, a haver tourada, que matem o touro na arena. Mas não. Como somos caridoso, ao contrário dos bárbaros dos espanhóis, o touro é levado para o curro, onde lhe são arrancados os ferros e as badarilhas. Depois, há duas hipóteses: ou foi um animal nobre e digno na sua performance (coisa da qual ele muito se orgulha), e então é lhe deitado sal nas feridas (ele não sente nada, pá!), para voltar à arena noutra altura, ou então fica ali, como está, eventualmente durante dias (normalmente de quinta-feira até segunda), para depois ser levado ao matadouro. Muito mais humano do que os espanhóis.
Já agora: quem é que já caiu de bate-cú? E quem é que já partiu o cóccix? Na pega, é semelhante: muito frequentemente, o rabeador parte a cauda ao touro. O touro não fica parado porque tem sete caramelos em cima dele, a cheirar a bagaço. Embora isso de certeza contribua, claro. Eu, pelo menos, parava a uns vinte metros. Ele para, porque aquilo dói! Puxar um gajo agarrado à cauda que está partida, deve ser upa, upa!
Outro factor, passa pelo cavalos. Alguém acha, verdadeiramente, que a reacção de um cavalo a um monstro de 450 kilos a avançar sobre ele, é de fazer uma "piaffe", dois passos para o lado, e deixar o touro raspá-lo na nalga?! O caraças! A reacção de qualquer bicho, seria a de atirar com o palhaço de traje de luces para o galheiro e trepar pelas tribunas acima como se não houvesse amanhã, e que se lixe o vestido novo da Tita Conceição e Sá de Mello!
Um cavalo, até ser admitido à tourada é treinado brutalmente, na verdadeira acepção da palavra, como qualquer animal que é forçado a ter comportamentos contra-natura.
A sério: deixem-se de enfileirar argumentos bacocos. Assumam que é um hábito bárbaro, mas que gostam e que vão continuar a lá ir, enquanto não for proibido. Porque acharem que eu, pelo menos, irei concordar com algum desses argumentos é uma ofensa. Que, porventura, me irrita mais do que o facto de irem à tourada.
De resto, e como sei que a minha argumentação também não convence ninguém que não esteja predisposto a tal (e esse já não é convencido; poderá é concordar), também fico na minha: espero que, todos os dias de tourada, morra muita gente. A sério. Eu, pelo menos, assumo: sou um bárbaro.

Já agora, desculpem lá qualquer coisinha, que isto ficou outra vez grande como o camandro.

Tuesday, 16 May 2006

Por enquanto...


  • Amplifier - Amplifier
  • Amplifier - The Astronaut dismantles HAL
  • Tool - 10.000 Days
...mas só mesmo enquanto estes três não batem à porta, o asterisco sonoro de hoje é ocupado com o novo dos Knife, que já estava para cá deixar há uns tempos.
De momento estou mesmo a gramar esta onda mais electrónica. Mas quando chegar o último dos Tool, esqueçam lá isso!

E quem é o animal, quem é?


Reabre hoje a praça de toiros do Campo Pequeno.
E, a partir de quinta-feira, todas as semanas, vou estar a torcer para que qualquer um dos seres humanos que lá ponha o pé na areia, só de lá saia na horizontal.
QUEREM TRADIÇÕES?! JOGUEM AO CHINQUILHO!

Plim plim

Eu, pelo menos, só hoje reparei: isto está muito mais pobre...

Monday, 15 May 2006

Eles falam, falam, falam...

O asterisco sonoro de hoje, resume-se, em português, a dois bitoques:
bitoque = 2 toques
2 bitoques = 4 toques
portanto, e numa conclusão perfeitamente lógica, aqui fica o "Toque Toque", dos Toque Toque. Que é como quem diz, Talk Talk.
Ui, os disparates...

Fundamento legal

Washington Monteiro de Barros foi um jurista brasileiro célebre. Em 2001 (!), foi editado o 2º volume dos seu "Curso de Direito Civil", centrado no Direito de Família. Na página 117, aparece esta pérola ("desbrasileirada" por mim e anotada, também por mim, no fim):
Entretanto, do ponto de vista puramente psicológico(1), torna-se sem dúvida mais grave o adultério da mulher. Quase sempre, a infidelidade no homem é fruto de capricho passageiro ou de um desejo momentâneo(2). O seu deslize não afecta de modo algum o amor pela mulher(3). O adultério desta, ao revés, vem demonstrar que se acham definitivamente rotos os laços afectivos que a prendiam ao marido e irremediavelmente comprometida a estabelecida estabilidade do lar(4).
Para o homem, escreve Somerset Maugham(5), uma ligação passageira não tem significado sentimental, ao passo que para uma mulher tem.
Além disso, os filhos do adultério da mulher, ficarão necessariamente ao cargo do marido, o que agrava a imoralidade, enquanto que os filhos do marido com a amante jamais estarão sob os cuidados da esposa(6). Por outras palavras, o adultério da mulher transfere para o marido o encargo de alimentar prole alheia, ao passo que não terá essa consequência o adultério do marido(7).
Anotações
(1) Como se verá mais à frente, não é "puramente psicológico".
(2) E nós, já se sabe, somos uns merdas que não conseguem resistir a nada, portanto está justificado.
(3) Que, por dedução, já deverá ser pouco, obviamente.
(4) Isto, porque ela terá de ir ter com o marido confessar o pecado, enquanto que ele poderá ficar caladinho; o que ela não sabe, não lhe faz mal.
(5) O mesmo autor da peça "The Constant Wife" (1927), na qual desculpabiliza a mulher que mata o marido infiel.
(6) Pois não: ficam sob os cuidados do corno do marido da amante...
(7) Vidé ponto (6).

Este gajo, para além de "envenenador" na Faculdade de Direito do Largo de S. Francisco (S. Paulo) foi juiz...

Friday, 12 May 2006

(Dis)Torcido? Eu?!


Para quem não tiver medo de fazer figuras tristes, é só encostar o lado esquerdo da cara ao monitor, de modo que umas das vistas (se eu escrevesse "olho", bei sei que comentários teria na segunda-feira...), fique um pouco à esquerda da seta (em alternativa, podem sempre imprimir a imagem, claro).
Mesmo não sendo um fim-de-semana comprido, desejo-vos que o pareça, seja sob que perspectiva for.

Spaccanapoli

Spaccanapoli era uma rua que cortava Nápoles ao meio e, ao mesmo tempo, era o nome de uma zona menos recomendável da cidade; ou chamemos-lhe "castiça", em alternativa.
Aliás, literalmente, quer dizer "a que corta (atravessa) Nápoles" - se se subir à cartuxa de San Martino, ainde se a vê bem, a atravessar a zona antiga da cidade:

Spaccanapoli também é, para além disso, um grupo musical, que adoptou esse nome por duas razões: em primeiro lugar, por serem todos napolitanos e quererem um nome que reflectisse as tradições musicais das suas composições e, em segundo lugar, porque, sendo um grupo de gente de tendência de esquerda (formaram-se, aliás, saidos dum grupo musical constituido por operários duma fábrica da Alfa Romeo), queriam assim protestar contra o desaparecimento duma zona tradicional da sua cidade, substituida por uma zona de comércio "nobre".
A sua influência musical mais óbvia, é a tarantella, uma música de dança tradicional, e as canções são cantadas no dialecto típico de Nápoles.
Ficam aqui, portanto, duas canções dos Spaccanapoli, para o fim-de-semana.

Thursday, 11 May 2006

A minha vingança

"Ó minha senhora, oxalá engasgue nessa merda que diz ser um bife!"
Estas foram as últimas palavras que senhora Felismina Marques, eterna - achava ele - sogra do sr. Silva, ouviu, antes de, efectivamente, se engasgar num pedaço de lombo (Promoção! 6€ / kg!), que se alojou, indevidamente, na traqueia.
Apesar de todos os esforços para reintroduzir aquele saudável rosa-bácoro à cara da senhora, o que incluiu o Zé Leonardo fazer "a manobra do gajo do anúncio que se engasga", nada funcionou.
O sr. Silva, que lá no fundo até achava que a sua sogra "sempre dava para um tipo passar o tempo quando estava chateado", chegou. inclusivé, e numa manifestação superior de sentimento de culpa, ir a um psicólogo, coisa da qual desistiu à terceira, porque "aquele atrasado mental do dôtor, pela massa que me anda a sacar, não tinha o direito de me proibir de levar umas minis. Eu até me descontraía mais facilmente!". Quem acabou por levar por tabela foi o Zé Francisco, já que foi recambiado para o mesmo consultório "a ver se o gajo lhe tira aquela mania dos bonecos, cum caraças!", isto depois de ter dasatado num pranto, porque a avó tinha morrido antes de lhe dar o Action Man que lhe prometera.
A sra. Silva, depois de uma semana sem dirigir a palavra ao marido e de, quando olhava para ele, o gelar, lá cedeu, sobretudo depois dele não querer mais do que sete minis durante o último desafio (Orgulho Picheleirense - 7, Sociedade Filarmónica e Desportiva Sacavenense - 3 - o árbitro deve poder voltar a ingerir sólidos lá para Julho). O sr. Silva, deitando todos os precauções ao vento, até lhe deu boleia até ao sanatório, para ir buscar o seu irmão (que lá estava internado, devido à doença mental subsequente a uma insufuciente oxigenação do cérebro durante o parto)! As coisas ficaram definitivamente bem, depois de ele deixar ficar o irmão da Sra. Silva lá em casa, ("Só até depois do funeral!") com a ressalva, de comer de pratos e talheres separados, que nunca se sabe...
O velório ainda deu azo a alguma discórdia, sobretudo depois de o Sr. Silva ter combinado com os amigos do tasco eles passarem por lá. A Sra. Silva discordou da opção de eles trazerem três grades de minis, uma mesa de plástico e quatro cadeiras, bem como os dominós e o baralho da sueca (que não é qualquer um: tem mulheres semi-nuas e foi marcado de comum acordo - já que era impossível jogar sem batota, agora faz-se batota, mas em igualdade de circunstâncias).
Lá se chegou a um compromisso: só a partir das onze da noite, e no largo, debaixo do poste de iluminação - o sr. padre também achou que na cripta, apesar do frio que estava de noite na rua, não podia ser.
No dia seguinte, pelas duas da tarde, lá seguiu o cortejo até ao cemitério do Alto de S. João, sendo que o Zé Leo ainda levou uma lambada quando achou que tinha uma piada bestial a avó ter de morrer para poder ir à frente. O Sr. Silva lá desistiu de obrigar o irmão da Sra. Silva a ir a pé ("a esta velocidade, não custa nada!") - ainda hoje, ninguém o convence de que a doença dele não se pega. No fim, lá acedeu a levá-lo de carro, desde que fosse sentado atrás, do lado direito, e respirasse pelo vidro aberto.
Surpreendentemente, apareceram bastantes familiares, alguns dos quais já não se viam há muito tempo, o que deu logo azo ao comentário que andariam "todos atrás do dinheiro da velha, é o que é!! Não pensem que levam um tostão! Depois de eu a ter deixado viver lá em casa e lhe ter pago as contas todas, era o que faltava!! Sanguessugas! Chulos!!".
Atrás do carro do Sr. Silva, seguiam os amigos do tasco, que tinham providenciado a grade de minis no porta-bagagens - o combinado era ir abri-las ao carro, para não interromper o sr. padre: nas palavras do Sr. Silva, "é uma questão de boa educação, pôrra!".
A seguir ao funeral, seguiu-se um lanche servido em casa dos Silvas, o que caiu que nem ginjas ao Zé Leo, que, depois de ter recuperado das tonturas devidas ao estaladão levado anteriormente, se perdeu de amores pela Vânia, prima em segundo grau, vinda de Brejos de Azeitão - como quem não quer a coisa, foi-lhe mostrar a aparelhagem nova que tinha na garagem.
Os amigos do Sr. Silva sairam do funeral mais cedo, com as chaves da casa, para poderem pôr "algumas minis" no frigorífico, o que não melhorou a disposição, naturalmente já abalada, da Sra. Silva, visto que, para criarem espaço, retiraram boa parte do lanche de lá, mas cedo demais.
A tarde foi passada em crescente boa disposição, pelo menos da parte do Sr. Silva e os seus amigos, bem como uns poucos familiares (seleccionados!!!) da falecida sogra. Tanto que, às cinco e meia da tarde, o Sr. Silva lá se teve de enfiar no carro, para ir buscar mais umas minis, não sem bater no Hyundai do sobrinho da sogra, o que não foi grave, porque ele já jazia inanimado na varanda, para onde o tinham arrastado para se recompor. O Sr. Silva, com a esperteza que o caracteriza, ainda teve a lucidez de comprar três grades mais três minis, que era para chegar com as grades completas ao sítio que, com o decorrer da tarde, se tinha espontaneamente convencionado chamar "a festa".
O Zé Leo e a prima Vânia foram encontrados atrás do sofá na garagem, o que ainda criou algum reboliço, com o Sr. Silva a declarar que "era o que faltava!!! Maich um anorlma.. alorna... maluquinho na família! Vai majé pó teu quarto, meu granda malandro!", acrescentando mais uma galheta ao já vasto currículo do seu filho mais velho, e incentivando os pais da menina a "levarem daqui echa galdéria!", o que também não caiu bem. No seu íntimo, no entanto, tinha a perfeita convicção de que o seu filho era "como deve ser, ao contrário do outro, com a merda dos bonecos".
Por volta das oito, e acabados os comes que a Sra. Silva tinha feito durante boa parte do tempo que intermediara entre a morte da mãe e a invasão familiar, as pessoas foram-se embora, com promessas de "um dia, temos de voltar a fazer isto!", sem pensar demais nas consequências destas palavras, nem na ocasião desta reunião familiar.
Pouco depois, o Sr. Silva, sentado na poltrona, dissertava sobre "aguela cambada de changuechugas!! Não penchem gue levam alguma coija!!", enquanto abria uma mini para se recompor de ter perdido clamorosamente a última sueca e a Sra. Silva, contrário ao que era o seu costume, decidiu adiar a arrumação.
Uma hora depois, quando saiu do antigo quarto da sua mãe, o Sr. Silva, enquanto mais uma mini entregava a sua alma ao criador, lá admitiu: "Chinto falta do raio da velha, pá..."

Friday, 5 May 2006

Eva

Em 1912 nasceu Eva Marie Gabriela von Kalckstein, na Prússia Oriental, perto de Königsberg. A família von Kalckstein fazia parte da “casta intocável” da nobreza prussiana, e assim o era já desde o século XII, altura do registo mais antigo que mencionava o nome.
Entre os seus representantes mais ilustres, contavam-se um grão-mestre da Ordem da Cruz de Malta, o educador do imperador Frederico o Grande e dois irmão com a história pitoresca de um ter cortado a cabeça ao outro. Todos os von Kalckstein tinham sido cavaleiros da “Ordem Alemã”, originalmente uma organização comparável aos Cruzados, com a diferença de se concentrar não na Terra Santa, mas sim no nordeste europeu. E com a particularidade de se ter convertido ao luteranismo, mais tarde.
Seja como for, Eva nasceu no seio desta família, como a filha mais nova de quatro raparigas. A sua mãe morreu pouco tempo depois da sua nascença, tendo o pai casado de novo, mas, ao contrário das histórias, a madrasta de Eva não era má, bem pelo contrário.
A infância era, essa sim, tirada das histórias: não lhe faltava nada. Andava a cavalo (coisa que adorava, e que iria fazer até quase aos oitenta anos), trepava às árvores (o que lhe deixou várias mazelas, ainda marcadas na pele muitos anos depois), brincava pela propriedade toda (o que era bastante: a família von Kalckstein era dona de um solar inserido numa propriedade vasta) e a escola era em casa: as famílias ricas não mandavam as crianças à escola.
Eva era uma maria-rapaz, o que fez com que, como é costume nas marias-rapaz, tivesse uma fila de rapazes atrás dela.
Como muitas raparigas nos “loucos anos 20”, e para grande insatisfação do seu pai, às tantas começou a fumar. Para ainda maior insatisfação dele, cachimbo!
Por volta da mesma altura, conheceu o seu futuro marido: Hans Otto Ulrich Welter era neto do grão-burgomestre de Colónia, e tinha uns tios, também abastados, na Prússia Oriental, não muito longe do poiso dos von Kalckstein, onde passava as férias. Ulrich era suposto herdar essa fortuna (o que nunca aconteceu, devido à Segunda Guerra Mundial) , sendo o único sobrinho, e tendo em conta que os Gramatzki (o nome dos tios dele) não tinham filhos.
Casaram em 1932, ano em que a NSDAP chegou ao poder. Chegada ao poder essa, que, como na maioria da população abastada e não-judia, não foi considerada uma das piores coisas que poderiam acontecer, mesmo tendo em conta que não partilhavam as opiniões de Hitler, bem pelo contrário. Na Prússia Oriental era-se, tradicionalmente, monárquica e votava-se sempre na União dos Democratas Cristãos.
Em 1939, nasce a primeira filha do casal, Katrin, e em 1943, a segunda, Barbara Christine Helene.
Por esta altura, Hans Otto Ulrich tinha sido, já bem trintão e num último exercício de desespero, incorporado no exército alemão, e, para cúmulo dos cúmulos, enviado para a frente leste. Safou-se a Estalinegrado, mas não se safou a uma granada. Por sorte, só ficou com um estilhaço na perna esquerda: foi o suficiente para ser enviado de volta para a Alemanha, mais precisamente para um hospital militar em Hamburgo. Até ao fim da sua vida iria coxear, muito ligeiramente.
Mais ou menos pela mesma altura, Eva decide fugir em direcção ao oeste da Alemanha: os russos estavam em pleno avanço e iriam, já se sabia, entrar pela Prússia a qualquer momento. O seu pai e a sua madrasta decidiram ficar para trás: os dois filhos adoptivos já tinham morrido (ambos na frente leste) já eram velhos e iriam morrer na terra a que pertenciam – mais tarde soube-se que os russos, na fúria de vingança, não só acelerariam essa morte, como iriam destruir tudo à superfície dessa mesma terra.
Assim, Eva pegou nas suas duas filhas, uma com 5 e outra com 1 ano e fez-se a caminho. Escondidas onde era possível,cosido às roupas, levava pratas. Algumas para tentar salvar, outras para pagar o que fosse preciso, pelo caminho.
Comboios, já não havia; só para transporte de tropas, que mais não eram do que miudos de 14, 15, 16 anos, cegos pela propaganda e com a morte marcada para pouco depois.
Um dos transportes foi num camião militar (o que era proibidíssimo). O condutor teve pena das três e disse-lhe para se esconder debaixo da lona, juntamente com a carga: granadas.
Já na Alemanha ocidental, e após ter visitado o marido em Hamburgo, a sua filha mais nova adoeceu. “Ruhr”, disse o médico. Era uma doença muito comum no pós-guerra alemão – o nome vinha da região industrial do Ruhr, onde ela tinha aparecido mais insistentemente. Christine, num dos seus últimos dias de vida, já sem capacidade de andar, pediu à mãe que a levasse a passear, coisa que esta fez, pegando-lhe (facilmente) ao colo. A meio do passeio, já sem forças para sequer falar, a filha apontou para umas groselhas à beira do caminho. Eva deu-lhas, apesar de o médico ter desaconselhado a ingestão de fruta – o estômago já não digeria. Devido a esta refeição não planeada, veio-se a descobrir, um pouco mais tarde, que era precisamente a ingestão do ácido contido nas groselhas que curava a Ruhr – Christine escapou, quando a morte já dobrava a esquina uns cem metros mais à frente.
Os episódio seguintes da vida de Eva, resumem-se ao que aconteceu a milhares de alemães: a lenta reconstrução de uma vida, o milagre económico alemão dos anos 60. Pelo meio, ainda nasceu a terceira filha do casal, Gisela. Até aos seus 80 anos, Eva montaria a cavalo, sempre que possível diariamente, apesar de ter osteoporose e uma forte calcificação das artérias, que, ao mínimo toque, abriam.
Aos 75 anos fez a sua última caça à raposa (que, na Alemanha, não se faz como em Inglaterra. A origem é a mesma (daí o nome), mas a diferença reside no facto de se atar um pano vermelho à cauda de um cavalo, cujo cavaleiro depois tem de tentar fugir aos outros. Ganha quem ficar com a fita).
Em 1999 morreu Ulrich. Tinha feito uma carreira na gestão de propriedades agrícolas. As suas últimas palavras foram de elogio a um tipo de batata que ele muito apreciava, e que cultivava num pequeno terreno que comprara.
Eva Maria Gabriela Welter, nascida von Kalckstein, morreu ontem, às 15.30. Para além de tudo mais, era uma jogadora de cartas miserável, e uma igualmente miserável batoteira; das coisas mais divertidas que eu fazia na férias na Alemanha, era jogar crapot com ela, ao fim do dia. Era bestialmente engraçado vê-la abrir os olhos e fazer uma expressão de espanto ao negar ter sido apanhada mais uma vez a fazer batota. Tinha a lata de, enquanto se discutia se teria feito batota ou não, tentar faze-la de novo.
À terceira, foi de vez: fez batota durante a Segunda Guerra Mundial, fez batota com a minha mãe e uns bagos de groselhas, mas ontem, já não conseguiu.

Wednesday, 3 May 2006

Chutos a rodos


O asterisco sonoro de hoje (e porque hoje não dá para mais nada...), é só para reforçar que, apesar de haver uma série de pistolas encostadas às minhas têmporas (algumas, tal como a da imagem, já dispararam, mas falharam - NABOS), ainda estou a mexer, apesar de a minha actividade por estes e pelos vossos lados andar um pouco mortiça. Ou, pelo menos, menos frequente do que eu desejaria.
Cheira-me que vai haver gente que vai gostar de voltar a ouvir os Simple Minds, ou não?

Tuesday, 2 May 2006

Maiz1

Para acompanhar o post que prova que, pelos vistos, "quase 1" também pode ser 1, desenterrei este asterisco sonoro, que aqui fica a dar: não é grande coisa, mas acompanha bem: "To be Number One" do Tom Hynes.

Precisamente

Já todos achamos, a dada altura, que a matéria dada nas aulas de matemática era totalmente desnecessária e que nunca mais na vida iriamos precisar daquilo. Que, portanto, aquilo era uma perda de tempo. Agora, duvido seriamente, que alguém negue o facto de a matemática ser uma ciência precisa, não? Então vejamos:
em primeiro lugar, divide-se um por três, exprimindo o resultado numa fracção

(que, como se sabe, mais não quer dizer do que "divida-se o número de cima pelo de baixo").
De seguida, inverte-se esta operação, multiplicando este um terço por três, o que dá, por extenso, três terços

o que, por sua vez, e pegando na definição anterior de "divida-se o número de cima pelo de baixo", dá, obviamente, 1

Logicamente, pegamos num número, dividimo-lo por outro e depois pegamos nesse resultado e multiplica-mo-lo pelo factor de divisão da operação anterior, tendo, assim, retornado ao ponto de partida.
Agora, façamos o mesmo, somente alternando a maneiro de exprimirmos o resultado: em vez de usarmos frações, usamos o método "tradicional". Dividimos um por três, o que dá 0,333333333333..., sendo que este encadeado de 3 é infinito (para definir este infinito, vamos colocar uma barra por cima do número que se repete ad infinitum)

- é fácil de fazer a conta: 1 a dividir por 3 dá 0,3, com um resto de 0,1, que, por sua vez dividido por três dá 0,03, com um resto de 0,01, e assim sucessivamente.
Agora, multiplicamos este 0,3 infinito por 3, o que, curiosamente, mas logicamente, dá isto:
Dá vontade de rematar com uma analogia ao "Triunfo dos Porcos", do George Orwell, portanto assim vai ser:
Todos os 1 são iguais,
mas alguns são mais iguais do que outros?


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